Quando a voz escondida no vento resolve cantar
Quando o verso embrulhado nas ondas aprende a dizer
Quando a estrela cadente no céu faz clarão na cidade
O poeta que vê, sob a luz já se prostra
Tanta cruz, tanta desarmonia no mundo a gritar
E o poeta com a luz recebida prepara o altar
E no rito que bem-aventura a palavra consola
Tira o peso da cruz, solidão vai embora
Toda vez que a divina palavra na voz tão humana
Se traduz, se revela, nos canta e bendiz
Alinhava este chão ao seu céu
Faz bordado nas almas dos réus
Põe caminhos nos pés dos que antes não tinham aonde ir
Toda vez que o dourado do céu cai na prata da história
E o mistério se deixa mostrar nos caminhos da voz
Faz profeta, o poeta e cantor
Da palavra faz gesto de amor
E polvilha de luz o caminho pra quem nele for
Toda vez que o profano recebe no ventre da alma
A beleza da arte que em Deus tem raiz
O divino nos desce do céu
Sobre o mundo derrama o seu véu
E a beleza rendilha os caminhos, nos põe noutra luz
Quando a dor no secreto do mundo consegue falar
Quando o algoz alojado nas sombras aprende a dizer
Quando a morte nas tramas da vida nos rouba a palavra
O artista que vê pede a Deus a resposta
E num misto de luz e penumbra se põe a buscar
A resposta que nunca responde mas faz prosseguir
E na arte que reza sem voz todo artista tempera
A dureza do chão com esperanças eternas
Padre Fábio de Melo
Eu na mira mirando a noite
Revirado no seu açoite, a solidão
Eu mirando a mina dos ventos
Dominado por seus tormentos e moinhos
Eu menino tornado adulto
Transtornado pedindo indulto, o cobertor
Eu poeta implorando versos
Desvendando esse universo tão sozinho
Eu no impasse de ser pessoa
Implorando que outra pessoa me conduza
Eu na mira da solidão…
Eu no rastro da procissão querendo rumo.
Vou no claro ou na escuridão
Vou seguindo o meu coração onde ele for.
No seguro da mamadeira
Ou no perigo ribanceira eu sou um só
Uma parte de mim reclama
Outra parte me põe na cama e faz carinho
Eu na prosa querendo verso
Ou na rosa do amor confesso, a cicatriz
Eu movendo o berço do mundo
Ou misturado no que é imundo
Eu quero a vida!
Padre Fábio de Melo
Deus mora em mim
Neste aqui onde em mim não sei
Neste ali tão de mim sem lei
Mora aonde eu não sei chegar
Falando em mim
Diz sem mim usa a minha voz
Mas por mim fala um outro a sós
No mistério de sermos nós
Quem desejar compreendê-lo
Queira por hora esquecê-lo
Queria abrir mão do que dele ouviu
Queira esquecer o que dele viu
Queria enfrentar o desconforto
Queria entrar no mar revolto
No sempre oculto no seu mistério
Só pra encontrar o dele é só seu
Deus mora em mim
Neste aqui onde em mim não sei
Neste ali tão de mim sem lei
Mora aonde eu não sei chegar
Falando em mim
Diz sem mim usa a minha voz
Mas por mim fala um outro a sós
No mistério de sermos nós
Quem desejar compreendê-lo
Queira por hora esquecê-lo
Queria abrir mão do que dele ouviu
Queira esquecer o que dele viu
Queria enfrentar o desconforto
Queria entrar no mar revolto
No sempre oculto no seu mistério
Só pra encontrar o dele é só seu
Só pra encontrar o dele é só seu
Pe. Fábio de Melo
Maria cheia de raça
não teve de graça o que recebeu
Quando alguém é um rio que gera um oceano
Não há nenhum tirano que arranque o que é seu
Um ventre quando se transforma em um santuário
é revolucionário ao meu modo de ver
Ninguém vai do parto ao santo sudário
sem saber porque
Tem que ter a luz da humildade
Cumplicidade, amor e revelia
Ninguém se torna mãe da cristandade
sem a santa ousadia
Olhos que velaram pelo sono de Adonai
Clareai o mundo, mãe, iluminai
Cada vez que um de nós se vê tentado
pela insana covardia
Divina mãe
Estrela luminosa que perpetuou Belém
Guerreira mãe
Nos dias de trevas nas ruas de Jerusalém
Olhai por nós
Nas horas de tristezas, nos momentos de aflição
E derramai
A poderosa força de vontade em nosso coração
Altay Veloso
Na dor da peleja há luz
No riso tem lágrima
No adeus da saudade a voz que promete
Que em breve vai regressar
Na fé que eu já sei de cor
Tem dor que eu não sei rezar
Há verbo que adjetiva
Sujeito imperfeito amar
Nos dias que o tempo leva
Memórias que vão chegar
No avesso que não se mostra
Segredos pra se levar
Nem toda reza é santa
Nem todo escuro é breu
Nem toda beleza encanta
Nem tudo o que tenho é meu
Nem todo amor nos ama
Nem todo ateu sem Deus
Nem tudo que é não nos nega
Nem tudo o que sou é meu
No chão do sertão tem mar
A espera de renascer
No olhar sertanejo a sede de chuva
É grito que clama aos céus
Na dor que eu já sei de cor
Na fé que não tem razão
Tem vértice no horizonte
Perfeita contradição
Padre Fábio de Melo
Quando a beleza reza as suas liturgias
Tudo é bonito até a dor em nos sangrar
Sagrando a terra o sagrado nos desperta
E põe nos olhos do mundo o seu olhar
Perdi minha frágil condição da criatura
Doce sutura me alcançando o coração
Lavra meus sonhos me semeia de esperanças
E configura o meu amor ao seu amar
E assim vou sendo eu querendo ser bem mais
Naquele que me faz ser ele outra vez
E assim sou o que sou naquilo que ele é
Mistério que me tráz o ausente sempre em mim
Quando o seu corpo se mistura no meu corpo
Não se confundem as distintas condições
O sempre outro em seus braços me recebe
Retorno ao rudi da beleza original
Retiro o exesso que ofusca a semelhança
Feito criança põe minh’alma pra dançar
Leva-me ao colo me apresenta o paraíso
Em meio ao riso me ensina o verbo amar
E assim vou sendo eu querendo ser bem mais
Naquele que me faz ser ele outra vez
E assim sou o que sou naquilo que ele é
Mistério que me tráz o ausente sempre em mim
Quando a tristeza se apodera da minh’alma
Com voz tão calma me assegura estar alí
Se nas estradas nas procuras não me acho
Vem no silêncio me conduz com terna luz
Quando as estrófes da minha vida andam tristes
Vem supreender-me com a luz do seu refrão
Sobre as palavras imperfeitas que eu possuo
Ele derrama o dom da sua perfeição
E assim vou sendo eu querendo ser bem mais
Naquele que me faz ser ele outra vez
E assim sou o que sou naquilo que ele é
Mistério que me tráz o ausente sempre em mim
Se no silêncio da minh’alma moram versos
Todo universo nasce do seu coração
Se com palavra a beleza adjetivo
Toda bondade nele encontra seu motivo
Trago na alma as marcas desta parceria
Ele no céu e eu aqui tão preso ao chão
Sou seu poeta ele é minha poesia
Eu não existo sem a sua inspiração
E assim vou sendo eu querendo ser bem mais
Naquele que me faz ser ele outra vez
E assim sou o que sou naquilo que ele é
Mistério que me trás o ausente sempre em mim
Padre Fábio de Melo
Tornar o mundo um só, um reino antigo
Onde se anda a pé, cantam moinhos
Fronteiras um convite pra cruzar
Outra casa é só chegar, outro irmão a conhecer
Muralhas só se for pra preparar
A surpresa que fará alegrar um coração
Mas quem nos apartou daquela força originária
Da luz da substância que nos torna uma só alma
Rezo pra que volte a inocência
O respeito, a descência sensatez falando em nós
E assim quem sabe a vida nos congregue outra vez
E o amor dissolva o véu das diferenças entre nós
Já que somos todos tão humanos
Se as dores são as mesmas, as misérias, as veredas
Não já não importa quem sejamos
Vale ver quem nos tornamos no plural que gera o nós
É ventre de mulher em vida a mãe terra
Gerando multicores raças e línguas
E Deus tão singular a nos falar
Nos nos amando com a voz que cada povo aprende ouvir
Em cada coração particular
Um detalhe universal amarrando todos nós
Mas quem nos apartou daquela força originária
Da luz da substância que nos torna uma só alma
Rezo pra que volte a inocência
O respeito, a descência sensatez falando em nós
E assim quem sabe a vida nos congregue outra vez
E o amor dissolva o véu das diferenças entre nós
Já que somos todos tão humanos
Se as dores são as mesmas, as misérias, as belezas
Não já não importa quem sejamos
Vale ver quem nos tornamos no plural que gera o nós
Já que somos todos tão humanos
Se as dores são as mesmas, as misérias, as veredas
Não já não importa quem sejamos
Vale ver quem nos tornamos no plural que gera o nó
Padre Fábio de Melo
Enquanto todo mundo espera a cura do mal
E a loucura fingi que isso tudo é normal
Eu finjo ter paciência
O mundo vai girando cada vez mais veloz
A gente espera do mundo, o mundo espera de nós
Um pouco mais de paciência
Será que é tempo que lhe falta pra perceber
Será que temos esse tempo pra perder
E quem quer saber a vida é tão rara, tão rara
Mesmo quando tudo pede um pouco mais de calma
Até quando o corpo pede um pouco mais de alma
Eu sei a vida não para, a vida não para não
Será que é tempo que lhe falta pra perceber
Será que temos esse tempo pra perder
E quem quer saber a vida é tão rara, tão rara
Mesmo quando tudo pede um pouco mais de calma
Até quando o corpo pede um pouco mais de alma
Eu sei a vida não para, a vida não para não
A vida não para e é tão rara
A vida não para a vida é tão rara
A vida não para
Lenine/Dudu Falcão
Quem não se doa na vida não pode ser grande
Demorei pra saber, demorei pra entender o porque
A regra que move o motivo de nossa vontade
Nem sempre nos mostra que o menos ás vezes é mais
Nem sempre aquele que ganha merece a vitória
Nem sempre aquele que perde deixou de vencer
A luz que hoje brilha no pódio no fundo tem sombras
Na sombra de quem hoje perde já pode ter luz
Quanto peso já levei comigo
porque não me deixei convencer
Que o profundo mistério da vida
não se serve em ganhar ou perder
Mas naquilo que fica de tudo
e o que faço da soma afinal?
Se transformo fracasso em vitória
ou se faço bem ser mal
Por tanto tempo eu pensei
que a vida fosse um jogo pra ganhar
Voando alto, acertando o alvo a pressa me levar
Mas o avesso de tanta vitória há uma derrota
que eu não quero ver
São as pessoas que perdi na vida
porque não soube escolher
Há sempre um jeito de ganhar perdendo
ou de perder para ganhar
A escolha certa determinará o que vai nos deixar
E que vale alguém ganhar o mundo?
Ou julgar o verbo possuir
Se depois não tem alguém na vida
com quem possa dividir
Mas do que vale alguém ganhar o mundo?
Ou julgar o verbo possuir
Se depois não tem alguém na vida
com quem possa dividir
Padre Fábio de Melo
Vendedor de sonhos
Tenho a profissão viajante
De caixeiro que traz na bagagem
Repertório de vida e canções
E de esperança
Mais teimoso que uma criança
Eu invado os quartos, as salas
As janelas, e os corações
Frases eu invento
Elas voam sem rumo no vento
Procurando um lugar e momento
Onde alguém também queira canta-las
Vendo os meus sonhos
E em troca da fé no volante
Quero ter no final da viagem
Um caminho de pedra feliz
Tantos anos contados a história
De amor ao lugar que nasci
Tantos anos cantando meu tempo
Minha gente de fé, me sorri
Tantos anos de voz nas estradas
Tantos sonhos que eu já vivi
Milton Nascimento/ Fernando Brant
Quebra o silêncio no mudo perdão da minha voz
Dissolve a mágoa, expulsa os resquícios da dor
Abre as janelas, expõe toda sombra ao sol
Se essa tormenta que o erro de ontem deixou
Destranca o amor, a esperança, a saudade, o sorriso
Rompe as cadeias dos ódios passados sentidos
Despensa as culpas, resguarda o amor que valeu
Que a vida é tão breve e o tempo não espera ninguém
Que o tempo não espera ninguém
Que o tempo não espera ninguém
No rio das graças mergulho a maldade que há
Ateia a bandeira, demarca o que é seu sob o céu
Recruta os sonhos que sonhos nos fazem viver
Cumpre a promessa de não desistir sem tentar
Rompe as barreiras elas dedicadas a vida
Parar as mazelas e o peso do dia deixou
Olhar altivo mas no coração cê é menino
Que a vida é tão breve e o tempo não espera ninguém
Que o tempo não espera ninguém
Que o tempo não espera ninguém
Linda e doída, menina por vezes mulher
Mãe ou carrasca, depende do humor que vier
Sábia e bondosa, açoita e aconchega depois
Drama as tristezas, mas tece alegrias também
Vida que chama, e que canta, e que chora, e que grita
Que serve a mesa, e oferece o banquete aos famintos
Que planta as mortas, que geram memórias bonitas
Que dita essa regra que o tempo não espera ninguém
Que o tempo não espera ninguém
Que o tempo não espera ninguém
Espera ninguém
Que o tempo não espera ninguém
Que o tempo não espera ninguém
Que o tempo não espera
Que o tempo não espera ninguém
Que o tempo não espera ninguém
Padre Fábio de Melo
Diz adeus
A tudo diz adeus
Desfaz a cena, o cais, desata o tempo
E a nos sorrir
Nos diz que vai partir
E que não voltará
Nunca mais
Diz adeus
A vida diz adeus
Faz a bagagem sem pensar em nós
E tudo o que viceja desverdece e diz
Também
Diz adeus, adeus
Vai sem mim
E põe em tudo um fim
Um descaminho e a sós desaconteço
Deixei de ser
Quem ontem fui e agora me despedirei de quem sou
Digo adeus
Vivendo eu digo adeus
Termino em tudo o que me faz viver
E em cada despedida eu me renovo e volto a ser
Ser adeus
Adeus!
Padre Fábio de Melo/ Cristovão Bastos
Escondido na palavra
Revelado no silêncio
Distribui a sua graça
Num amigo que me abraça
Deus me ama e me defende
Ilumina o meu caminho
Com a lanterna de um menino
Dá sentido á minha vida
Quando um verso me convida
Desenhar uma canção
Vem ver Deus vivendo entre nós
Passeando nunca a sós
Em humanos corações ele está
Nestes altares de gente e de flor
Sente e conhece a nossa dor
Vem crer que o mistério dessa fé
Põe sapato em nosso pé
Quando a estrada for doída demais
No breu da tristeza ou da solidão
Na mão de um amigo está sua mão
Vem ver todo amor remediar
Remediar
O rancor fazer a mala e partir
Ver a maldade perder e ruir
No gesto que abraça e faz sorrir
Me faz cantar lailaaialaia
Que me abraça e faz cantar
Padre Fábio de Melo
Mais que a dor do amor
Viver a dor me doeu
Eu quero mesmo é ser feliz
Amar, amor
Quem não semear não vai colher
Ai de quem é um e nunca será dois
Por não saber
Quem irá me valer?
São pessoas, é a caminhada
Quem irá me valer?
São meus sonhos no pó da estrada
Quem irá me valer?
É o sorriso que guardo comigo
Quem irá me valer?
É segredo de fazer amigo
Fernando Brant/Milton Nascimento